O poeta grego Simônides, nascido seis séculos antes de Cristo, era famoso por sua fantástica capacidade de construir o que os retóricos chamam de “palácios de memória”. Foram esses os espaços-informação originais: as histórias convertiam-se em arquitetura, conceitos abstratos transformados em vastas – e meticulosamente decoradas – casas imaginárias. O estratagema de Simônides baseava-se numa peculiaridade humana: nossa memória visual é muito mais duradoura que a memória textual.
– Steven Johnson: Cultura da Interface – Capítulo 1 – Mapeamento de bits: uma introdução.
Divertidamente (ou Inside Out) é um dos exemplos mais belos e inteligentes da capacidade ilimitada da arte em criar narrativas e imagens simbólicas. O filme constrói um universo alegórico visual da psique, onde esferas coloridas são as memórias e as emoções e comportamentos são controlados por seres chamados Alegria, Raiva, Medo, Tristeza e Nojinho. Há também as ilhas de personalidade. Ilha da família, da honestidade, da bobeira. E o indispensável amigo imaginário. Além do abismo das memórias descartadas, o lixão das experiências esquecidas.
Riley está naquela fase meteórica da vida chamada adolescência. Quem comanda a sala de controle de seus sentimentos é Joy ou Alegria. Os outros sentimentos têm seu peso na personalidade e comportamento da menina e também são os zeladores de suas lembranças. A mãe de Riley tem a Tristeza como dominante e o pai, o Raiva. Mas isso não significa que a menina lida com uma mãe deprimida e um pai destemperado. São apenas traços dominantes das personalidades.
A família sai do meio-oeste americano e chega a São Francisco. Portanto, Riley e seus companheiros mentais têm de encarar as aventuras de uma mudança. Nova escola, nova vizinhança e a saudade dos amigos e da paisagem que ficou para trás. A Alegria faz de tudo para manter Riley com espírito elevado e evitar influência da Tristeza.
Mas as esferas douradas da alegria precisam, às vezes, de um verniz azul de tristeza. Precisamos dos momentos de dor para vivê-los, para entender a dor do outro e para redescobrir a alegria.
Recomendo a leitura da resenha da cientista cognitiva Janet Blatter.